quinta-feira, maio 20, 2004

Egoísmo e Individualidade

Somos feitos de percepções. Nada exatamente "É", tudo se parece. A velha história da cor: o que é vermelho para mim, pode ser o verde para o outro.

 

Então, liberdade acaba sendo um conceito absurdamente relativo. A minha liberdade acaba quando esbarra na do outro, etc. Nesta era de múltiplas definições, onde tudo foi relativizado e se usa muito mais o "e" do que o "ou" (recombinação de conceitos a todo o momento,  especialidades multidisciplinares, ao invés de integrarmos uma "classe social", integramos um "cluster”   - não estamos mais inseridos apenas dentro das classe A, B ou C, mas somos de tal sexo, em tal faixa de renda, com tais preferências, tais gostos e tais atitudes - etc.), me pergunto se alguém realmente sabe lidar com a liberdade.

 

Foi "fácil" definir liberdade em um mundo maniqueísta como o da década de 60-70, quando "mocinhos" e "bandidos" eram teoricamente óbvios. Tudo o que não era de um lado, era de outro. Hoje somos múltiplos, e doutrinados, ao menos aqui no ocidente, a supervalorizarmos nossa postura individual. E essa postura individual cria valores sem que ninguém faça uma "triagem" - Não existe um elemento que "garanta" o entendimento que nós teremos dos conceitos mais óbvios... Na verdade nunca existiu, mas igreja e estado fizeram em parte esse papel até um certo momento da história.

 

Falando de novo em "valor universal", parece uma grande besteira supor que dois indivíduos cheguem às mesmas conclusões sobre mais do que 50% dos temas que discutirem... E como a democracia é feita de  50% mais um, "justiça" não parece ser um conceito bem trabalhado no ambiente democrático. As fantasias provocadas pelo desejo de incorporação de símbolos de poder (tome Jack Daniels e os leões se renderão à sua segurança / dirija um Stillo e possua todas as mulheres/ tenha um celular e seja popular / Seja você também uma Darlene, uma loira do Tcham ou uma BBB4...) talvez possam ser traduzidas, em última instância, em "fantasias de liberdade", uma vez que liberdade é poder de ação (voar, sonhar), é independência (quem já não sonhou em se "livrar" do chefe e ser um "empreendedor"?), é a manifestação perfeita do ego ocidental, que migrou o rito coletivo para a esfera individual, dificultando o compartilhamento e provocando mais intolerância. Quem já viu "Sex and the City" deve ter percebido o quanto a "liberdade" nova-iorquina é mostrada de forma bairrista naquele seriado. Manhattam é o mundo, o único mundo da maioria das personagens, e seus rituais individuais, como pedir comida chinesa no mesmo velho restaurante e considerar qualquer coisa que não pertença ao universo deles (ou seja,  que não comprem sapatos de 300-1000 dólares e que não freqüentem restaurantes e bares onde as "hostesses”  ESCOLHEM quem entra) como "Freaky" ou "Wired"...

 

Com esse pano de fundo, manter relacionamentos nos dias de hoje é criar obras de arte... É pena que nem sempre preservemos nossos acervos. Quem assistiu "The Commitments", viu um grupo musical com potencial para "Beatles" discutir questões pessoais e brigar até acabar - no dia em que eles teriam uma reunião com um olheiro de uma gravadora, todos brigaram com todos...Pergunto-me se não seria desperdício de potencial "humano" o modo como usamos nossa liberdade para justificar atos egoístas, me incluindo nesta ação.

 

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